sábado, 18 de janeiro de 2014

CONTRACORRENTE | Discurso Direto

Dos palcos para o disco, Contracorrente lançou no final de 2013 o seu primeiro registo discográfico, sob a chancela da d'Eurídice. O espectáculo da d'Orfeu faz homenagem à música de intervenção mundial, reunindo no seu primeiro EP homónimo cinco emblemáticas músicas, incluindo o tema "A morte saiu à rua". Hoje a "remar contracorente", é minha convidada Sara Vidal, a voz do projecto Contracorrente.
Portugal Rebelde - A edição do EP “Contracorrente” tem como objetivo primordial resgatar da memória e reivindicar para a atualidade algumas das músicas e vozes da resistência que marcaram a História do séc. XX?
Sara Vodal - O EP é apenas uma pequena amostra do espectáculo Contracorrente, que nasceu no seio da d'Orfeu Associação Cultural com um impulso muito conceptual sobre a actualidade da música de intervenção mundial, não somente portuguesa. Há essa preocupação de resgatar a memória histórica através das músicas que tocamos e de fazermos uma homenagem aos seus compositores e cantores, mas paralelamente inspiram-nos a reflectir como ainda hoje elas fazem sentido, isto é, têm mensagens e reinvindicações muito actuais.

PR - “A morte saiu à rua”, um original de José Afonso é um dos 5 temas que compõe este disco. Em 2013 esta canção foi galardoada com o Prémio Adriano Correia de Oliveira no Festival Cantar Abril, atribuído à melhor recriação de canções de resistência. Quer falar-nos um pouco da importância desta canção para o coletivo Contracorrente?
SV - O reportório de Contracorrente foi concebido como uma viagem por vários países, culturas e idiomas, em que cada tema aborda um determinado conceito, como a Liberdade, o direito das Mulheres, a ditadura, a luta dos povos indígenas, entre outros. No caso da música “A morte saiu à rua”, é uma evocação a todas as vítimas do regime salazarista, porque fala concretamente sobre o pintor José Dias Coelho, que foi assassinada pela PIDE a 19 de Dezembro de 1961. O nosso arranjo também faz uma pequena ponte com o “Cantar Alentejano”, recordando Catarina Eufémia, também ela assassinada pelas forças do regime fascista. Então, por toda esta carga simbólica e a mensagem que lhe é inerente, é um tema que tem uma força particular.

PR - Podemos afirmar que o EP “Contracorrente” é um “manifesto” de que ainda hoje, resistir é uma forma de existir?
SV - Sem querer ser um panfleto partidário, pretendemos despertar essa ideia de que todos nós somos partícipes da nossa sociedade e que também temos a responsabilidade de mudar as coisas para melhor. Se queremos salvaguardar os nossos direitos, temos a obrigação de não calar as injustiças, de sermos solidários e de trabalharmos em conjunto para encontrar soluções. Não basta criticar os políticos nas conversas de café e não pode ser o “salve-se quem puder”.

PR - Odete Ferreira, escreve no press release deste EP, que “cantiga é mina que mata. É remo contracorrente”. É mesmo assim?
SV - O poema (lindíssimo!) de Odete Ferreira retrata muito bem o espírito de Contracorrente e, sem dúvida, que a cantiga, a música, é um veículo de expressão com muita força, através do qual podemos denunciar, criticar, reinvindicar ou mesmo enaltecer muitas situações. Se durante os regimes fascistas do século passado havia a necessidade de o fazer mais subtilmente, hoje em dia podemos fazê-lo de forma mais directa, mas sempre sem perder esse poder comunicativo que a cantiga tem.

PR - Para terminar, depois da edição deste disco, podemos esperar que continuem a remar contracorrente?
SV - Acima de tudo, esperamos que venha uma maré alta de prosperidade e justiça social, mas certamente que continuaremos a remar e a recriar novas músicas. Quem quiser juntar-se à tripulação, pode acompanhar-nos na nossa página web www.dorfeu.pt/contracorrente.
 
Portugal Rebelde | 18 Janeiro 2014

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