No passado dia 24 de Setembro, fui ao Festival Internacional de Teatro Cómico da Maia espreitar o Reportório Osório, e ó se valeu a pena!
O projecto tem chancela da Associação Cultural D’Orfeu
(Águeda) e consiste basicamente numa colecção de canções sobre as
aventuras e desventuras amorosas de uma série de personagens masculinas,
relatadas na primeira pessoa. A voz poderosa de Luís Fernandes, a quem
também cabe a autoria das letras, junta-se ao acordeão de Sónia Sobral. A
música é de Luís Cardoso.
A primeira nota que gostaria de deixar relativamente a este projecto
é sobre o respeito (mais: o amor!) com que a língua portuguesa ali é
tratada. Num panorama cultural enxameado de pérolas como «Porque é que a vida nos trama / Quando alguém se ama» (João Pedro Pais) ou «Fica calma eu acho melhor acabarmos bem»
(Anselmo Ralph) e num país onde os órgãos de comunicação social (desde
telejornais ou imprensa escrita) não conseguem completar uma edição sem
uma calinada na gramática ou na ortografia, as letras do Reportório
Osório não soaram apenas como uma lufada de ar fresco: pareciam cantigas
de amigo no meio de uma página de facebook adolescente.
A segunda nota vai para as interpretações. O talento (como letrista,
mas também como cantor/declamador) de Luís Fernandes é evidente, e a
cada nova história de vida surgia efectivamente um novo personagem em
palco, com novos tiques, idiossincrasias e expressão corporal. Pode soar
simples, mas não é assim tão fácil de conseguir, numa colecção com mais
de uma dezena (salvo erro) de personae diferentes, e praticamente sem acessórios.
A pequena fadinha que o acompanhava, Sónia Sobral, não lhe
ficou atrás, aliando o virtuoso toque do acordeão à grande
expressividade e ao ar alegre de quem claramente se diverte com o que
faz – o que é sempre um bom princípio para divertir o próximo.
Personificando, ainda que de forma difusa, o lado feminino das histórias
(o inimigo mudo), contruiu um eficaz contraponto ao colega,
deixando clara a química entre os dois. Junte-se a isto a (excelente)
música de Luís Cardoso, e fica composto um todo francamente original.
Há um grande risco de se cair em pseudo-*ismos de todo o género
quando se começa um projecto conceptual como este, e acrescenta-se-lhe
ainda o perigo de, pura e simplesmente, se acabar com um frankenstein
artístico sem ponta por onde se lhe pegue. Mas também há uma boa
recompensa (para os artistas e para o público) quando tais obstáculos
são evitados. Foi o que sucedeu com o Reportório Osório, um projecto de
música portuguesa de excelente qualidade que merecia maior divulgação.
Deixo-vos com a história do Eugénio; mas também está disponível a história do Amândio (aviso: esta segunda é altamente catchy). De qualquer forma, se tiverem oportunidade de lhes cruzar os caminhos, ao vivo é sempre melhor.
Parceiro Pensador | 10 Outubro 2013
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